martes, julio 24, 2007

Deriva ecológica

A ecologia vive hoje um debate muito semelhante ao debate vivido pela genética de populações nas décadas de 60 e 70, quando Kimura propôs que a evolução nucleotídica seguia um padrão neutro (as variações se fixavam aleatoriamente e não direcionada por seleção positiva). Atualmente a ecologia tem aplicado teorias neutras para explicar a estrutura das comunidades, em oposição às teorias que defendem que as comunidades são estruturadas pela competição por nichos.(Hu, He et al. 2006; Maurer and McGill 2004).

O principal nome do neutralismo ecológico (eu diria o “Motoo Kimura da ecologia”) é Stephen Hubbell e sua teoria unificada neutra da biodiversidade (TUNB) (Hubbell 2001). Hubbell propôe que a coexistência das espécies deve ser explicada por fatores historicamente contingentes, como por exemplo, quais espécies chegaram primeiro à comunidade, quantos espécies os recusrsos de uma determinada área sustentam, etc.



A maior evidência em favor da TUNB são os dados experimentais. Simplesmente, assim como os modelos neutros da genética de populações, os modelos neutros em ecologia funcionam. Ou seja, assim como Kimura mostrou que os modelos null de variação se adequavam a taxa de substituição de peptídeos verificada em proteínas como o citocromo c e a hemoglobina, Hubbell verificou que modelos neutros se adequavam à variação observada, principalmente, em sua ampla pesquisa com biodiversidade de árvores tropicais.

Os modelos formais da TUNB se caracterizam por considerarem irrelevantes as diferenças entre indivíduos de diferentes epécies que ocupam um mesmo nicho (fitness invariance). Hubbell alega que a exclusão competitiva levaria tanto tempo que fenômenos como especiação, dispersão e deriva ecológica a tornaria irrelevante. "Communities are open, nonequilibrium assemblages of species largely thrown together by chance, history, and random dispersal. Species come and go, their presence or absence is dictated by random dispersal and stochastic local extinction" (Hubbell, 2001, p. 8-9).

Por outro lado, Hubbell define as teoria de competição por nicho (TCN) assim: This view holds that communities are groups of interacting species whose presence or absence and even their relative abundance can be deduced from "assembly rules" that are based on the ecological niches or functional roles of each species (e.g., MacArthur 1970, Levin 1970, Diamond 1975, Weiher and Keddy 1999). According to this view, species coexist in interactive equilibrium with the other species in the community. The stability of the community and its resistance to perturbation derive from the adaptive equilibrium of member species, each of which has evolved to be the best competitor in its own ecological niche (Hubbell, 2001). 
A TCN tem sido retrabalhada para responder à algumas críticas modernas. O principal ponto é que a coexistência de espécie em um mesmo nicho é justificada pela existência de trades-offs. Se duas espécies de um mesmo nicho (no sentido amplo de nicho, talvez melhor definido como guilda) coexistem, elas devem manter trades-off. Por exemplo, uma espécie deve ser melhor em se esconder e a outra em fugir, de maneira que exista um balanço entre esta propriedades (Chase and Leibold 2003).

Os dois esqueminhas abaixo representam as duas teorias. A TCN prevêm que as comunidades possuem uma estrutura estável que foi historicamnete moldada por competição. Se um evento disponibiliza recursos, o equilíbrio é restabelecido. Já a TUNB não espera que a estrutura seja estável, mas dinâmica. Cada vez que recursos são disponibilizados, ocorre uma "deriva ecológica" (expressão de Hubbell) e uma nova estrutura é estabelecida.





Creio que para a maioria dos leitores deste blog não é surpreendente que modelos ecológicos que ignoram a competição por nichos funcionem. Afinal, se a comunidade possui uma estruutra dinâmica e histórica, nada mais razoável que ela derive. No entanto, os modelos neutros tem sofrido certa resistência, principalmente por não se encaixarem em muito dos pressupostos neodarwinistas.
Creio ainda que uma deriva ecológica se tornará cada vez mais plausível a medida os nichos passarem a ser concebidos como nichos-ontogênicos e não como nichos fenotípicos. Levar a plasticidade fenotípica a sério, ao invés de considerá-la um ruído, minaria muito dos pressupostos da TCN.

Chico

Chase, J. M. and M. A. Leibold (2003). Ecological Niches: Linking Classical and Contemporary Approaches, University of Chicago Press.

Hu, X. S., F. He, et al. (2006). "Neutral theory in macroecology and population genetics." Oikos 113(3): 548-556.

Hubbell, S. P. (2001). "The unified neutral theory of biodiversity and biogeography." Á Princeton: 375.

Maurer, B. A. and B. J. McGill (2004). "Neutral and non-neutral macroecology." Basic and Applied Ecology 5(5): 413-422.

9 comentarios:

A. Vargas dijo...

Espectacular!!! I love it!!!

Anónimo dijo...

Como decia siempre Felix Schwartzman citando a otro sabio: "Es la teoria lo que decide lo que se puede observar"...

Basta trabajar en terreno desprejuiciadamente para poder encontrar situaciones de coexistencia bien interesantes!..
Creo que se puede ir mas lejos inclusive de lo que se propone en ese libro ya que en las comunidades existe mucha facilitacion entre especies..(a penas tenga un tiempo escribire algo para que compartamos esa discusion).

Ahora una critica hacia la escuela de la deriva natural, el prejucio tacito (y a veces no tanto) que se le tiene a los estudios naturalistas o de terreno, no ha hecho mas que retrasar el desarrollo de elementos de analisis y discusion desde la perspectiva de la deriva, la unica forma de desarrollar este conocimiento es metiendo las manos en la masa (o mas bien los pies en barro) estudios que no son por eso menos profundos ni relevantes que otro tipo de estudios de laboratorio!


Diablete

A. Vargas dijo...

encuentro particularmente fascinante el hecho de que funcione tan bien el "fitness invariance". Es notable que Maturana y Mpdozis hayan dicho prevaumente con toda claridad que la adaptación no es una variable, sino una constante.

A. Vargas dijo...

estos autores sólo hablan de fitness invariance entre especies, o también entre los individuos de una misma especie?

Nucleo Decenio dijo...

Isto é algo que é particular da teoria de Hubbell. Ela se baseia na teoria de biogeografia de ilhas de McArthur e Wilson, que considerava ESPÉCIES de um mesmo nível trófico adaptativamente equivalentes. A TUNB, diferentemente, considera todos os INDIVÍDUOS de diferentes espécies em um mesmo nível trófico como adaptativamente equivalentes. Há equivalência intraespecífica e interespecífica (se as diferentes espécies usam os mesmo recursos). Algo que de fato se adequa com a idéia de M&M de que a adaptação é invariável.

Anónimo dijo...

I use neutral to describe the assumption of per capita ecological equivalence of all individuals of all species in a trophically defined community. This is a very unrestrictive and permissive definition of neutrality because it does not preclude interesting biology from happening or complex ecological interactions from taking place among individuals. All that is required is that all individuals of every species obey exactly the same rules of ecological engagement...Thus, the essential defining characteristic of a neutral theory in ecology is not the simplicity of its ecological interaction rules, but rather the complete identity of the ecological interaction rules affecting all organisms on a per capita basis. In the present book, I will consider only one class of all possible neutral theories. I examine the consequences of assuming that population and community change arises only through ecological drift, stochastic but limited dispersal, and random speciation.

Hubbell (2001)

Anónimo dijo...

Me agrada que uma abordagem sistêmica-histórica tem ganho cada vez mais espaço em teoria ecológia. Seria um ótimo exercício aproximar a macroecologia e a biogeografia histórica à tese de deriva natural. Creio que formaria um todo coerente.

A. Vargas dijo...

Es interesante además porque un "mito popular" es que la deriva sólo describe cambios moleculares sin efectos fenotipicos. M&M en cambio describen a la totalidad de la evolución como una "deriva natural": la conservación y diversificación de los fenotipos ontogénicos, que no es un proceso en que "aumente" la adaptación".
En este caso Hubbel demuestra que la noción de neutralismo y deriva se aplican también con éxito a nivel biogeográfico

Anónimo dijo...

Pois é: deriva molecular e deriva ecológica. E no nível organismal? A proposta de M&M cada vez se torna menos extravagante...